Sem Identidade (2011)
Jaume-Collet Serra (conhecido realizador de “A Orfã” e “A Casa de Cera”) tinha várias formas de contar esta história. Podia virar o filme completamente ao contrário bem à moda de Tarantino, podia andar para a frente e voltar para trás constantemente e podia fazer o que fez. Fez o que fez, e fê-lo muito bem feito. “Sem Identidade” conta-nos a história de Martin Harris (Liam Neeson), um cientista que se desloca a Berlim para uma conferência mas que tem um infeliz acidente de carro que o deixa em coma durante 4 dias. Quando acorda, depara-se com um mundo que ignora de uma forma radical a sua existência. Ninguém sabe quem ele é e outra pessoa assumiu a sua identidade. A sua mulher não se lembra dele, bem como os seus colegas. As poucas provas que poderia ter vão-lhe escapando por entre os dedos e os danos causados na sua memória deixam-no arrasado. E mais não posso contar.
Esta é a premissa do filme e é isso que o torna delicioso. Mas atenção, delicioso apenas no fim. Houve alturas durante o filme em que só pensava que iria “estripar” esta longa-metragem no nosso blogue, que iria reclamar o dinheiro do bilhete. Há pouca acção e muito diálogo. Mas a premissa do filme consome-nos, leva-nos a resistir a tudo para saber o que se passou com Martin Harris e aqui devo reconhecer uma certa genialidade nos argumentistas. Anteciparam todas as reacções, sabiam que tudo iria ser lento demais, tinham de dar algo aos espectadores que os fizesse ter paciência, e deram. Afinal, uma obra tem de ser avaliada no seu todo, é para esse propósito que o filme é produzido e no final odiei-me por ter pensado que o filme estava perdido. É que cheguei mesmo a pensar que no final eles não iriam conseguir sair de tamanha odisseia e que o esperado grande final seria um enorme fail. No entanto, os dois twists finais são brutais, adorei o entretenimento, a revolta, a curiosidade, a (im)paciência. Dei por mim a torcer por Martin Harris como se ainda se pudesse mudar o fim da história. Enfim, o filme causou em mim imensas sensações e reacções e isso só pode ser bom. Outro ponto genial deste argumento é que no início a história parece fechar todas as possíveis saídas e explicações para aquilo estar a acontecer, o que torna o final ainda mais épico. Grande história, com um final bem conseguido e que é muito bem aceite. Acima de tudo, uma história extremamente bem contada. Para a realização, um prémio para os pequenos detalhes que este filme contém e que são muito relevantes para a história. Não me vou alongar senão sou levado ao Tribunal dos Spoilers, mas há certos movimentos e certas deixas de certos personagens que nos deixam a pensar que o actor não tinha dormido naquela noite ou não tinha decorado o texto, quando depois tudo faz sentido. Esta explicação assenta-se perfeitamente em January Jones, odiei-a durante todo o filme, parecia tão fora do contexto. Mas no final, sim, esteve sempre dentro do contexto.
Liam Neeson está em grande. A personagem Martin Harris assentou-lhe como uma luva. Sempre adorei este actor, é um daqueles casos em que não percebo como é que os prémios lhe escapam, grande actor. O mesmo para Diane Kruger, aliás, sei que sou suspeitíssimo para falar, mas todos os actores que participaram em “Sacanas Sem Lei” têm arrancado por aí grandes interpretações. Diane Kruger representou na perfeição uma personagem que era um oásis no meio do deserto de Martin Harris e que de certa forma queria também enviar umas mensagens cá para fora sobre a imigração ilegal na Alemanha. Uma boa nota ainda para Frank Langella, um autêntico mestre, que depois de “Frost/Nixon” se tem dedicado a estes pequenos papeis que lhe ficam muito bem. Gostei também do detective nazi alemão que ajuda Martin Harris a “encontrar-se”, desempenhado pelo actor Bruno Granz, que já tinha impressionado em “O Leitor” e “O Complexo de Baader Meinhof”.
Passando agora à parte técnica, uma banda sonora muito fraquinha. Penso que aqui também se deve àquela confusão que acabamos por fazer com o género deste filme. Um filme de acção sem grande acção e por isso uma banda sonora que acaba por passar despercebida. Em relação à fotografia, penso que se poderia ter tirado muito mais partido da cidade de Berlim, especialmente da noite de Berlim, ambiente em que são filmadas várias cenas. Quando à realização, volto a elogiar os timings que foram utilizados para o revelar de certos pormenores muito importantes e o trabalho com os actores que foi determinante no “encobrir” de uma história que no fundo era perfeita. Fazendo a inevitável comparação com uma das grandes surpresas do ano de 2007, o “Taken” de Pierre Morel, com Liam Neeson no principal papel, são duas personagens muito parecidas mas que Liam Neeson consegue dissociar perfeitamente. Taken tem mais acção, mais realismo, mais sensibilidade e mais emoção. “Unknow” tem mais racionalidade, mais conspiração, mais calculismo. Dois filmes totalmente diferentes mas que chegam a ser muito próximos. Espero uma co-realização de Serra e de Morel, para nos darem uma mistura de ambos os filmes e daí sair uma obra-prima.
Em resumo, um grande filme, uma grande história. Algumas pontas soltas, algumas falhas daquelas que nos fazem rir, mas que nem vale a pena mencionar. No final, só fica a ideia de uma história que nos faz pensar e falar nela durante muitas horas e que nos entreteu e consumiu de uma forma que adorámos.
EXAME
Actores: 9.5/10
Realização: 9/10
Banda Sonora: 5.5/10
Fotografia: 6.5/10
Duração/Conteúdo: 9/10
Argumento/Enredo: 10/10
Transmissão da mensagem para o espectador: 9/10
Média Global: 8.4/10
Crítica feita por Pedro Gonçalves
Informação
Título em português: Sem Identidade
Título Original: Unknown
Realização: Jaume Collet-Serra
Ano: 2011
Actores: Liam Neeson, Dianne Krueger, January Jones
Trailer do filme:
3 comentários
Não discordo em nenhuma palavra! Se tivesse de fazer uma crítica tão detalhada, tocaria da mesma forma nesses pontos! e LIAM NEESON é gigante na arte de representação!
ResponderEliminarEsta crítica fez-me ter ainda mais vontade de ver o filme! Adoro o Liam Neeson e o filme parece-me ser muito interessante.
ResponderEliminarExcelente crítica Pedro =)
Alguns filmes em que participa até podem ser dejectos (não é o caso deste), mas ele é sempre um senhor que transmite competência.
ResponderEliminarEste filme parece à primeira vista, mais um entre muitos do género, mas rapidamente Neeson e o realizador elevam-no para outros planos, sem nunca cair no ridículo.
Tempo muito bem gasto a vê-lo.