Shame (2011)
By Jota Queiroz - quinta-feira, agosto 23, 2012
Michael Fassbender no seu melhor.
Steve Mc Queen está para Michael Fassbender assim como, por exemplo, Tim Burton está para Johnny Depp. Steve McQueen começa a ver em Fassbender o seu actor fetiche que, após o aclamado Hunger em 2008, voltou a contratar o actor em 2011 para Shame e em 2013 estarão de novo de volta em Twelve Years a Slave. A dupla de facto resulta e, tal com em Hunger, Steve McQueen volta a presentear-nos com um filme incrível.
Desta vez a película centraliza-se em Brandon Sullivan (Michael Fassbender), que vive sozinho em Nova York. É um indivíduo atraente e bem sucedido: uma vida normal aparentemente perfeita. Porém, Brandon esconde algo doloroso que o transtorna permanentemente e o faz viver uma segunda vida - o seu vício em sexo. Desta maneira, não consegue relacionar-se normalmente com mulheres ou manter qualquer relação romântica. Por isso mesmo, a sua vida aparentemente perfeita não é nada mais do que vazia e oca, sendo ele apenas um objecto físico que tem em mente suprir as suas necessidades a toda a hora. A chegada da sua perturbada irmã mais nova Sissy (Carey Mulligan) piora tudo.
Shame é um filme agressivo, admirável, esplêndido, ousado e provocador, que contém no seu argumento um tema tabu actual. Caracteriza na plenitude um homem viciado em sexo: masturba-se em tudo o que é sítio, é obcecado por pornografia hardcore, tem visitas frequentes de prostitutas contratadas e os flirts são uma constante no seu dia-a-dia. Esta caracterização poderia ter levado um caminho mais obsceno, no entanto o realizador Steve McQueen mostra a sua qualidade cinematográfica ao levar Shame pelo caminho oposto ao erotismo vulgar. Aliás, as inúmeras cenas de sexo são oportunas e têm o seu objectivo. Creio que o realizador fez um trabalho esplêndido na maneira como expôs o vício da personagem principal, com os silêncios cortantes e os diálogos viscerais, que se conjugam com um background mais monótono. Nesse mesmo background está patente a serenidade e o tom metálico da maior parte das cenas. Acho todo este ambiente meticulosamente bem trabalhado durante o filme, e existem cenas magistrais. Gosto igualmente o como está retratada a falta de capacidade da personagem principal em relacionar-se normalmente com pessoas e ter relacionamentos românticos, catalisando toda a sua energia nos seus vícios.
Relativamente a aspectos negativos, temos algumas cenas excessivamente longas que simplesmente cortam com o ritmo do filme, por exemplo a cena da balada New York, New York (interpretada por Carey Mulligan); apesar de compreender o simbolismo da cena e o seu objectivo, creio que a mensagem poderia ser retida na mesma pelos espectadores cortando muitos minutos. Outro aspecto que devo salientar é a sensação agridoce com que se fica no final do filme, pois esperamos por um clímax que nunca é alcançado, como se de um crescendo infinito se tratasse.
Michael Fassbender desempenha a sua personagem de uma forma soberba, não só fisicamente, mas também espiritual e psicologicamente. A sua performance era digna de uma nomeação ao Óscar - não só pela nudez,
mas pelas expressões faciais, o olhar hipnótico, o falar, a voz, enfim, tudo - mas a Academia parece esquecer e ignorar o que realmente importa no mundo cinematográfico. Talvez pensaram que uma personagem viciada em sexo não seria "digno", mas enfim, também se esqueceram de Ryan Gosling em Drive. Carey Mulligan também surpreendeu-me com a sua interpretação ousada e arriscada, mostrando que de facto é uma actriz completa.Em suma, a minha opinião sobre Shame é bastante positiva e recomendo este filme; contudo, pode não agradar aos mais conservadores, impacientes ou para quem gosta de mais acção, sequências rápidas, ambientes mais coloridos ou dinamismos.
EXAME
Realização: 9/10
Duração/Conteúdo: 7/10
Efeitos/Fotografia: 8/10
Transmissão da ideia principal do filme para o espectador: 8/10
Média Global: 8.2/10
Crítica feita por Joana Queiroz
Informação
Título original: Shame
Título em português: Vergonha
Ano: 2011
Realização: Steve McQueen
Actores: Michael Fassbender, Carey Mulligan
Trailer:
5 comentários
Gostei da sua resenha. Acredita que nunca assisti ao filme? Sua crítica me deixou entusiasmado!
ResponderEliminarFilme brilhante. Uma experiência profundamente dolorosa e intensamente melancólica. Michael Fassbender arrebenta.
ResponderEliminarhttp://avozdocinefilo.blogspot.com.br/
Não vi o Hunger, portanto este é o primeiro filme que vi do Steve McQueen. Está mesmo bom, apesar de reconhecer (e tal como referes na tua crítica) alguma excessividade na duração de algumas cenas. Como não estava habituado a tal "lentidão" achava ao início entediante, mas depois aprendi a usar isso como meio de absorver todos os pormenores. Gostei.
ResponderEliminarSPOILER ALERT!
ResponderEliminarVi o filme ontem.
Começo por elogiar os actores, achei que tanto Michael Fassbender como Carey Mulligan estiveram muito bem. A sua actuação foi a melhor coisa do filme.
Quanto à história, achei-a vazia o que consequentemente fez com que as personagens fossem vazias. Vazia porque se focou demasiado no vício de Brandon Sullivan e os outros campos da vida dos dois Sullivan ficaram por contar. Passarei a enumerar e a explicar por pontos:
- Não se chega a perceber razoavelmente porque é que a irmã é um "desastre" tão grande e aparece na vida do irmão, ficando o espectador apenas com a péssima resposta: "fez asneiras e precisou do irmão" é o mesmo que dizer "é um desastre porque sim e veio porque sim". Detesto estas personagens marcantes que aparecem como que do nada e considero tal um grande erro para a consistência e estrutura duma história...
- Da mesma maneira que não se percebe porque é a irmã é um "desastre", o ódio que por vezes Brandon tem à irmã também fica sem uma explicação razoável, pois esta recairia no passado dos dois que... não existe...
- A profissão de Brandon também é outra incógnita. O que para mim é impressionante, devido ao número de cenas que influenciam a história e que têm origem no seu local de trabalho. Sabe-se que Brandon tem uma secretária e um computador que teima em não ficar arranjado. Aliás, até me dá impressão que Brandon tem uma profissão e ao mesmo tempo não tem, pois (se não me engano) por 2 dias não trabalhou por estar sem computador e noutro dia saiu do nada com Marianne e foram até um hotel. Considero isto outro aspecto que não dá consistência à história. Para Steve McQueen e Abi Morgan tanto dá se Brandon trabalha ou não. Supostamente desempenha uma profissão, mas depois não se vê a fazer nada e ainda recebe calorosos elogios do seu patrão, que são merecidos, pois o espectador vi-o a fazer... nada... Isto parece-me ridículo.
- Não se percebe donde surge este vício de Brandon. É mais uma coisa que cai do... nada. Ninguém nasce viciado em sexo, mas Stece McQueen e Abi Morgan parecem pensar o contrário e Brandon é a grande excepção. Assim, a falta de consistência desta história neste ponto, fez-me pensar durante um bom bocado que Brandon não era um viciado em sexo, mas uma pessoa apenas com dificuldade em estabelecer uma relação afectiva, por não conseguir confiar nos outros. A cena em que Marianne e Brandon estão a jantar num restaurante, impulsionou, em mim, essa hipótese enquanto visualizava o filme, pois aí Brandon afirma que não não conseguiu ir para além dos 4 meses de namoro e não achava necessário o casamento, nem acreditava em relações duradouras - magicava eu nesta altura que fosse por não ter confiança nas outras pessoas. Era fulcral ter sido explorado o passado de Brandon para perceber como chegou ali, mas Steve McQueen e Abi Morgan acharam uma excelente ideia largar esta bomba assim do nada.
Continuação:
ResponderEliminar- Outro erro de consistência. Brandon não conseguiu iniciar uma relação sexual com Marianne no hotel. Ora, até aqui o espectador fica a pensar "uma relação sexual normal já não o estímula". No entanto, o que é que aparece logo a seguir? Uma prostituta vulgar (vulgar tendo em conta as "poucas" loiras que aparecem no filme e com as quais tem sexo) a ter sexo vulgar com Brandon... Poderão afirmar algo do tipo "Brandon conseguiu ter sexo com a prostituta, porque era uma pessoa estranha e tal estimulou-o", no entanto, Marianne não lhe era chegada, eles mal se conheciam. Tiveram um jantar em que ficaram a saber pouco um do outro e onde estava mais do que patente, que o que imperava ali era a atracção física e não os seus interesses/objectivos em comum ou algo do género... Portanto, fica a pergunta para Steve McQueen e Abi Morgan, como é que um viciado em sexo aborda uma senhora apenas porque o atrai fisicamente e com a qual deseja ter sexo (é ele que a leva para o hotel) e depois "bazinga!" não consegue ter um erecção? Então, o rapaz quer ter sexo com ela, mira-a (só faltou babar) e vai atrás dela no local de trabalho e depois todo o desejo sexual desvanece-se? Isto é muito incongruente...
Este é, para mim, um daqueles filmes em que os actores principais desempenham os seus papéis divinamente, mas é pena serem papéis com falta de consistência...
Termino concluindo que Steve McQueen e Abi Morgan focaram-se apenas no vício e nas suas demonstrações e em pouco ou nada mais. Se a história deste filme fosse um jogo de Jenga, a dupla Steve McQueen e Abi Morgan teriam perdido a partida e a grande vencedora seria a Inconsistência.